Em tempos de campanha eleitoral, a palavra “gestor” surge como um mantra sedutor. Apresentada como sinônimo de eficiência, modernidade e soluções técnicas, essa figura parece trazer para a complexa administração pública a suposta eficácia do mundo corporativo.
Candidatos desfilam jargões como “SWOT”, “planejamento estratégico” e “métricas de desempenho”, pintando um quadro de controle e racionalidade. No entanto, na fria realidade da prefeitura, essa promessa frequentemente se revela uma fachada, um discurso ensaiado que vende mais ilusão do que capacidade.
A sedução reside, em parte, na crença de que experiência em grandes empresas ou cargos de destaque automaticamente se traduz em aptidão para governar uma cidade. Mas a gestão de uma corporação, focada em lucro, mercado e resultados financeiros para acionistas, difere fundamentalmente da gestão pública municipal.
A prefeitura lida com o bem-estar coletivo, com direitos sociais, com a garantia de serviços essenciais para todos os cidadãos, independentemente de sua “rentabilidade”. Não se trata de otimizar processos para maximizar lucros, mas de equacionar recursos escassos para atender a necessidades humanas multifacetadas e, muitas vezes, urgentes.
Problemas cruciais do cotidiano – o asfalto esburacado que danifica veículos e causa acidentes, a fila interminável em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) que nega dignidade e põe vidas em risco – não são questões de alinhamento ideológico entre esquerda ou direita. São falhas estruturais e operacionais da administração pública.
Quando um político simplifica isso como mera “falta de gestão”, muitas vezes está apenas usando um termo genérico para desviar a atenção de sua própria falta de preparo, prioridades equivocadas ou, pior, de sua desonestidade.
O discurso do “gestor” pode ser, ironicamente, uma forma de má gestão da comunicação, camuflando a ausência de propostas concretas e o desconhecimento da realidade local.
Administrar uma cidade exige um espectro de habilidades muito mais amplo do que a simples aplicação de técnicas corporativas. Requer profunda compreensão das dinâmicas sociais, empatia para dialogar com comunidades diversas, capacidade de articular diferentes setores (saúde, educação, segurança, infraestrutura, cultura), e um compromisso ético inabalável com o interesse público.
Não é apenas sobre “cortar custos” ou “aumentar a produtividade” nos moldes de uma empresa; é sobre investir com inteligência, distribuir recursos com equidade e construir soluções sustentáveis que melhorem efetivamente a vida das pessoas.
O que a população realmente necessita não é de um CEO da cidade, mas de um servidor público vocacionado. Alguém que entenda que ser prefeito é uma dedicação integral, um “sacerdócio” cívico, como bem colocado.
Alguém que não se limite a cumprir expediente ou posar para fotos protocolares, mas que esteja genuinamente comprometido em resolver os problemas, cobrando sua equipe, fiscalizando obras, ouvindo os cidadãos e trabalhando incansavelmente – sem distinguir dias úteis ou fins de semana, porque os problemas da cidade não tiram folga. A verdadeira “gestão” pública se manifesta na capacidade de transformar essa dedicação em resultados tangíveis para a coletividade.
Portanto, da próxima vez que um candidato empunhar a bandeira de “gestor”, vá além do rótulo. Questione a fundo:
Qual a sua real experiência com a administração pública e suas particularidades?
Como ele pretende aplicar seus conhecimentos (se houverem) para resolver especificamente o buraco da Rua X ou a demora no atendimento da UPA Y?
Quais são as propostas concretas, detalhadas e factíveis que demonstram que ele conhece a fundo os desafios desta cidade, e não apenas repete chavões?
Ele está disposto a essa entrega total, ética e transparente que o serviço público exige, ou busca apenas mais um cargo em um currículo?
A escolha de um prefeito é a escolha de quem estará à frente da máquina responsável por garantir nossos direitos e serviços básicos. Não podemos nos contentar com vendedores de ilusões ou com a promessa vazia de uma “gestão” genérica.
Precisamos de líderes que demonstrem, na prática e em propostas claras, seu preparo técnico para a esfera pública, sua empatia com as necessidades da população e, acima de tudo, sua inegociável dedicação em transformar a realidade da nossa cidade, colocando a mão na massa muito além dos discursos e das fotos de campanha. Nossa cidade e seus cidadãos merecem a seriedade que o cargo exige.