Assisti ao Apocalipse nos Trópicos, da Petra Costa, já sabendo o que me esperava. Petra tem aquele olhar típico da esquerda intelectualizada, onde tudo vira tese, metáfora, drone e um piano triste de fundo. Mas fui. Fui porque acredito que a gente precisa escutar até quem pensa diferente. Mesmo que a gente discorde. Mesmo que a gente revire os olhos a cada 15 minutos.
E sim, o documentário tem um viés claro. Denuncia, acusa, dramatiza. Mas, no meio das cenas do 8 de janeiro, dos pastores berrando no púlpito e dos políticos com mãos postas em orações vazias, uma frase martelava na minha cabeça: “Deus não se mete na política. Ele se mete com pessoas.”
Foi aí que o filme me pegou. Não pela estética, nem pelo roteiro (cansativo, confesso), mas pela pergunta que ficou me queimando por dentro: em que momento a fé virou cabo eleitoral?
Porque, se você parar para pensar, não tem nada mais perigoso do que usar Deus como argumento para dominar mentes. Quando líderes políticos e religiosos colam o nome do Criador a projetos de poder, seja à direita ou à esquerda, o que se perde é a liberdade. E, pior ainda, o que se machuca é a alma do povo.
Não estou aqui dizendo que o filme é uma obra-prima, está longe disso. Mas ele escancara um problema real: a instrumentalização da fé para fins políticos.
Eu cresci aprendendo que fé se vive no silêncio da contemplação do sagrado, na vida pessoal, na visita ao vizinho enlutado. Não no grito histérico das redes sociais. Não na legenda com versículo bíblico em post eleitoral. Não na tentativa de dizer que só um lado tem Jesus no coração.
O problema não é ser evangélico, católico, espírita ou ateu. O problema é quando o outro vira inimigo porque pensa diferente de mim sobre política. Quando a religião vira trincheira, a espiritualidade perde sua essência. E o Brasil, que já carrega dores demais, se parte mais uma vez.
Talvez o “apocalipse” de que fala Petra não seja uma tragédia futura, mas esse presente polarizado, onde ninguém escuta mais ninguém e todo mundo acha que fala em nome de Deus.
A política pode até tentar colocar Deus num palanque. Mas Ele desce. Ele vai até aqueles que o procura. Porque Deus não é bandeira. Deus é presença.
E disso, Petra acertou sem saber.